Em algum lugar da Mesopotâmia, 3000
anos antes de Cristo.
- Matusalém está doente!
As ruas se encheram de gente.
Pessoas correndo de um lado para o outro e dizendo a mesma coisa:
- Matusalém está doente!
Aquela simples frase parecia
despertar o mais sombrio pesadelo, pois quem a ouvia ficava em estado de
choque.
- Não pode ser verdade! Matusalém não pode morrer! Não
agora!
- Será que tem algo a ver com aquilo que aquele doido do Noé
está fazendo?
- Acho que vi alguma nuvem esquisita no céu.
Estamos na Mesopotâmia, na pequena
cidade de Eriduk. A causa de tanto alvoroço é um homem muito velho chamado
Matusalém. Ele já tem 969 anos. É a pessoa mais protegida do mundo. Desde algum
tempo, pessoas de vários lugares se revezam em cuidar daquele velhinho. Ele
nunca adoeceu na vida. Na verdade, nunca ninguém deixou que ele adoecesse. Como
assim?
Matusalém era conhecido por quase
todo mundo como o “calendário de Deus”. Seu pai, Enoque, que desaparecera
misteriosamente alguns anos antes, era um profeta. Durante 65 anos de sua vida
Enoque viveu como se Deus não existisse. Mas um certo dia, Deus se revelou para
ele. O choque foi tão grande que Enoque não conversou com ninguém durante
vários dias. No mesmo período sua esposa deu a luz um menino. Todos os que
estavam presentes ficaram assustados quando ouviram Enoque, com o menino nos
braços, dizer:
- Este menino se chamará Matusalém!
- Matusalém? – Um ancião coçou a barba e esclareceu – em
nossa língua esse nome significa: “QUANDO MORRER, ISTO VIRÁ!” Isto o que,
Enoque?
O homem, como que em transe,
levantou uma das mãos para o céu e disse:
- O Senhor vai julgar esta geração pervertida. Ele não
agüenta mais ver tanta opressão. A terra está corrompida à vista de Deus e
cheia de violência. Ela será destruída, com todos os seus habitantes. E o juízo
virá no ano em que este menino morrer!
Logo que Enoque acabou de falar,
muitas vozes exaltadas se fizeram ouvir:
- Você tá louco?
- Deus não existe, seu estúpido!
- Até a semana passada você se divertia com a gente e agora
vem com essa conversa idiota!
- Vai virar profeta agora, Enoque?
- Quando este menino morrer, o juízo virá! – Enoque
continuava repetindo, com o olhar perdido em algum lugar do céu.
Apesar da grande incredulidade do
povo antediluviano, Matusalém passou a ser temido e reverenciado. No fundo
muita gente temia que a profecia de Enoque fosse verdadeira. Alguma coisa tinha
acontecido na vida daquele homem, pois com o nascimento do filho ele mudara
radicalmente. Antes era um homem da noite, um sujeito que adorava viver como se
fosse morrer no dia seguinte. Não tinha religião e não reverenciava nenhum
Deus.
Mas, de repente, da noite para o
dia, algo revolucionou sua vida. De repente, virou um profeta. Um profeta tão
convicto da verdade que pregava que deixava os ouvintes estarrecidos. E o
menino Matusalém crescia.
Mais tarde, Matusalém gera um filho,
Lameque. E o tempo vai passando. Apesar do mundo continuar cada vez pior, quase
ninguém acreditava que haveria um julgamento divino. Mas todos temiam que
Matusalém morresse. Por isso o rapaz cresceu cercado de cuidados. Se pegasse
algum resfriado, era motivo suficiente para deixar muita gente de coração na
mão.
Matusalém não podia adoecer.
Matusalém não podia morrer. Senão o mundo acabava!
Então nasceu Noé, filho de Lameque,
neto de Matusalém. Quando completou 500 anos recebeu uma estranha mensagem
divina: O MUNDO IRIA ACABAR MERGULHADO NAS ÁGUAS!
Durante quase 100 anos dedicou-se a
construir um gigantesco barco, debaixo de zombarias e xingamentos. E Matusalém
estava envelhecendo.
Ano 600 de Noé. A fantástica arca
está pronta. Noé garante que Deus destruirá o mundo com uma grande chuva. Mas
quase todos acham isso impossível. Noé continua pregando e insistindo para que
as pessoas se voltem para Deus.
Então, a notícia se espalha como
fogo na palha numa tarde quente: MATUSALÉM ESTÁ MORRENDO!
Todos os médicos mais inteligentes
da região foram chamados urgentemente para que não deixem o homem morrer. Se
Matusalém morrer, o juízo divino virá. Talvez o maluco do Noé esteja certo
mesmo.
Todavia, apesar de temerem o fim se
Matusalém morrer, ninguém dá ouvidos à pregação de Noé. A porta da arca
continuava aberta, mas somente os animais haviam entrado. Os animais e a
família de Noé.
Então, Matusalém morreu. Muitos
olhares de terror encaravam os céus, aguardando a ira divina. Mas nada
aconteceu. Então, enquanto os parentes choravam pela morte do homem que mais
vivera até ali, a multidão ímpia resolveu festejar, zombando de Enoque, Noé e
de Deus.
Bonecos foram improvisados para simbolizarem
Matusalém, Enoque e Noé. E nas festas e desfiles tais bonecos foram
ridicularizados e violados.
Matusalém estava morto. Então todos
os que estavam próximos da arca, zombando de Noé, ficaram paralisados ao verem
uma mão misteriosa descendo do céu e fechando a porta.
Durante uma semana, a arca
permaneceu com a porta fechada, mas nada aconteceu. Apesar do estranho fenômeno
envolvido no fechamento da porta da arca, as pessoas logo procuraram esquecer,
confiando cegamente em explicações fajutas trazidas pelos céticos de plantão.
Mas após 7 dias, o temporal desabou
sobre a terra.
(Trecho retirado de um romance
inédito sobre o Arquivo7).
Moacir R. S. Junior – morganne777@hotmail.com